LET'S ROCKNuma das sessões mais aguardadas do Fólio 2025, Ricardo Araújo Pereira e Joana Marques marcaram presença na tenda Vila Literária, em Óbidos, este sábado, 18 de outubro. A conversa com o tema “Liberdade”, moderada pelo jornalista José Mário Silva, os humoristas falaram sobre os processos judiciais de que já foram alvo e provocaram várias gargalhadas na plateia. Foi abordada a disputa dos Anjos com Joana Marques, e ainda houve espaço para uma história com Marcelo Rebelo de Sousa.
A tenda principal do festival literário estava completamente lotada e muita gente não conseguiu sequer entrar (após várias horas na fila), mas os sortudos que assistiram à sessão fizeram questão de receber a dupla em apoteose, com uma enorme salva de palmas. José Mário Silva deu o mote para o arranque da conversa, dizendo que seria demasiado redundante falar sobre os limites do humor. Por isso, pediu a Ricardo Araújo Pereira (RAP) para falar livremente sobre o que quisesse. O apresentador de “Isto É Gozar Com Quem Trabalha” falou da responsabilidade que acarreta viver em liberdade, até chegar à absolvição de Joana Marques no julgamento do processo interposto pelos Anjos.
“Gosto muito da liberdade, porque é uma coisa excelente, mas perigosa e chata. Desde logo, porque nos permite dizer aquilo que nos apetece, mas também a aceitar o que os outros dizem. Neste momento, parece-me que é algo que está sob ameaça e a prova disso é a Joana, que esteve quatro dias num tribunal”, afirmou RAP, que contou ainda que quando foi depor a tribunal, cumprimentou os irmãos Sérgio e Nelson Rosado e que estes responderam de forma algo hostil. “Talvez tenha dito duas ou três coisas desagradáveis sobre eles”.
A autora da rubrica “Extremamente Desagradável” relatou também uma situação que aconteceu no tribunal, que, para ela, ilustra na perfeição o que é a tentativa de limitar a liberdade de alguém apenas porque não gostámos do que disseram sobre nós: “A dada altura, Nelson Rosado disse à juíza que ninguém podia pôr em a causa a sua performance. Para mim, esse momento definiu tudo o que ali se passou.”
Joana Marques comparou ainda o seu processo com o caso da agressão de Will Smith a Chris Rock, por causa de uma piada sobre a sua esposa, na cerimónia de entrega dos Óscares, em 2022. A radialista ficou surpreendida por ter sentido que “a esmagadora maioria estava do seu lado, algo que não sentiu em relação a Chris Rock, sendo que em ambos os casos houve uma reação completamente desproporcional em relação ao efeito da piada”.
Na sua rubrica na Renascença, Joana Marques satiriza diariamente figuras públicas por declarações e entrevistas feitas pelos próprios visados. O seu humor mordaz e corrosivo tem-lhe valido várias críticas, tendo já sido acusada de bullying. Para Ricardo Araújo Pereira, este tipo de situações são um sintoma da “infantilização da sociedade”.
“As pessoas querem dizer coisas sem nexo e ser aplaudidas por isso. Querem dizer coisas parvas sem ninguém lhes aponte o dedo. Uma das primeiras formas da literatura portuguesa foram as cantigas de escárnio e maldizer. Qual é o mal de gozarmos uns com os outros!?”, exclamou, recebendo uma grande ovação da plateia da tenda Vila Literária, no Fólio.
A aposta ganha por Marcelo Rebelo de Sousa
Marcelo Rebelo de Sousa deixará a presidência da República Portuguesa no próximo ano e, tanto os humoristas como o moderador defendem que o político, nos últimos anos, tem mostrado ser um bom exemplo de fair play relativamente às piadas de que é alvo. RAP aproveitou ainda para contar uma história bastante caricata sobre Marcelo.
“Durante a pandemia de Covid-19, o Presidente da República deu uma entrevista em que deu a entender que tinha um esquema para escapar ao confinamento. Logicamente, peguei naquilo, mostrei no meu programa e fiz piadas sobre o assunto. No dia seguinte, recebo uma chamada do Marcelo em que ele me diz: ‘Já ganhei um almoço à sua conta.’ Isto porque ele apostou um almoço com um amigo em que eu ia usar aquelas declarações no programa”, conta, arrancando muitas gargalhadas da plateia.
No final da sessão no Fólio, houve espaço para questões e a NiO perguntou aos comediantes que dessem a sua opinião sobre a participação de vários dos humoristas mais famosos do mundo – como Dave Chapelle, Louis CK, Kevin Hart, Bill Burr ou Jimmy Carr – no Festival de Comédia de Riade, na Arábia Saudita. Nos últimos anos, vários humoristas que participaram no festival têm alertado para o crescimento de uma cultura do cancelamento nos EUA. Contudo, mesmo tendo de assinar um contrato com uma cláusula que os impedia de fazer piadas sobre a família real saudita ou sobre religião, acabaram por aceitar participar no festival, — decisão criticada por muitos.
A opinião dos dois humoristas portugueses foi unânime: “Não é chocante que tenham ido, porque a oferta terá sido choruda, mas, pelo menos, assumam que foram por dinheiro. É hipocrisia dizer que foram lá por outro motivo qualquer”.
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